Como pais podem evitar tragédias em família? Pastores orientam

Uma série de crimes cometidos por adolescentes contra seus próprios familiares tem chamado atenção no Brasil nas últimas semanas. Os casos, que envolvem pais, irmãos e até avós assassinados por jovens entre 13 e 16 anos, apontam não apenas para a brutalidade dos atos, mas para um colapso mais profundo nas relações familiares.

Em muitos deles, os motivos relatados parecem banais — a proibição de um namoro virtual ou a retirada de um celular —, mas os desdobramentos revelam um cenário de vínculos frágeis, ausência de diálogo e desestrutura emocional.

Caso em Itaperuna

Na segunda quinzena de junho, um adolescente de 14 anos matou o pai, a mãe e o irmão de 3 anos na cidade de Itaperuna, no interior do Rio de Janeiro. Conforme informou a CNN Brasil, o crime teria sido motivado pela proibição dos pais a um encontro presencial com uma adolescente de 15 anos, que ele conheceu por meio de um jogo online. Após o assassinato, o jovem arrastou os corpos até a cisterna da residência e, ao confessar o crime, declarou que “faria tudo de novo”.

A polícia apurou que dias antes o adolescente havia feito pesquisas sobre como sacar o FGTS da família. A arma utilizada pertencia ao pai e estava guardada sob o colchão. O caso causou comoção nacional e se soma a outros registrados nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná, todos com elementos semelhantes: conflitos mal resolvidos, distanciamento emocional, acesso a armas e a ausência de arrependimento.

Desgaste silencioso

Para líderes cristãos, esses episódios revelam um desgaste que começa muito antes da violência. O pastor Marcelo Aguiar, da Igreja Batista da Mata da Praia, em Vitória (ES), afirma que “prevenir é sempre melhor do que remediar. A igreja previne quando orienta pais e filhos com relação a um convívio harmonioso”. Segundo ele, o ambiente comunitário pode identificar sinais de alerta antes que o problema se agrave.

O pastor destaca que a ruptura nos vínculos familiares não acontece de forma abrupta. “Muitas vezes os pais se sentem perdidos, sem saber como estabelecer limites saudáveis. Em outras ocasiões, se mostram ausentes ou omissos, gerando insatisfação nos filhos”, afirmou. Ele compara a criação equilibrada a um pássaro: “Assim como um pássaro precisa de duas asas para voar, um filho precisa que seus pais lhe proporcionem duas coisas: carinho e limite”.

Autoridade e afeto

Segundo especialistas e líderes religiosos, a ausência de equilíbrio entre autoridade e afeto pode gerar reações extremas. O pastor Marcelo cita o ensinamento bíblico registrado em Efésios 6.1-4, que orienta os filhos à obediência, mas também adverte os pais: “Os filhos devem obedecer aos pais, e os pais não devem provocar à ira os seus filhos”. Para ele, o esvaziamento de valores bíblicos tem favorecido a fragilidade nos lares.

“Infelizmente, valores como a obediência filial e a responsabilidade paterna têm sido solapados pela sociedade moderna. Isso tende a agravar os conflitos familiares”, declarou. Diante de um ambiente desprovido de limites claros e vínculos afetivos, o risco de comportamentos extremos aumenta.

Reflexão pastoral

O pastor Josué Gonçalves, líder do Ministério Amo Família, comentou publicamente o caso de Itaperuna. Em suas redes sociais, lamentou: “Um menino de 14 anos matou os pais e o irmão de 3 anos, jogou os corpos numa cisterna e disse que faria tudo de novo. A motivação? Os pais não aceitavam seu namoro com uma garota de 15 anos que ele conheceu num jogo online. Como pais, essa tragédia precisa nos acordar”.

Gonçalves compartilhou uma série de orientações para pais, reforçando que a prevenção exige vigilância, escuta ativa e presença significativa dentro de casa. Para ele, pais e mães precisam reavaliar o papel que exercem na formação dos filhos e entender que o tempo de mudança é agora.

Caminhos de restauração

Apesar da gravidade dos fatos, líderes cristãos apontam para a possibilidade de reconstrução. O pastor Marcelo defende que é possível restaurar os laços familiares com base na fé cristã. “Talvez pais e filhos precisem mudar de comportamento, liberar o perdão e administrar as consequências dos erros cometidos. Mas, com a ajuda de Deus, eles podem ter sucesso no estabelecimento de uma relação familiar saudável”.

Essa restauração, no entanto, não deve ser buscada apenas após uma crise. A proposta, segundo ele, é de cuidado contínuo, diálogo constante, vigilância emocional e disposição para ajustar comportamentos. “Não se trata apenas de orar mais ou de confiar que tudo será resolvido com fé. Trata-se de traduzir essa fé em práticas diárias, como tempo de qualidade, afeto disciplinado, vigilância emocional e busca por ajuda quando necessário”, explicou, à revista Comunhão.

10 orientações para prevenir tragédias

O pastor Josué Gonçalves compartilhou uma lista com dez práticas preventivas voltadas a pais e responsáveis. As recomendações destacam a importância de atenção emocional, supervisão digital e resgate de valores fundamentais.

  1. Presença intencional – Estar em casa não é o mesmo que estar presente emocionalmente.

  2. Educação com afeto e limites – Autoridade sem amor afasta; permissividade sem direção destrói.

  3. Supervisão digital – Internet não é babá. Acompanhe os jogos, conversas e conteúdos acessados.

  4. Fale sobre afetos e relacionamentos – Proibir sem diálogo estimula o segredo e o isolamento.

  5. Atenção à frieza emocional – Falta de culpa e facilidade para mentir são sinais de alerta.

  6. Armas e segurança – Em casas com adolescentes, armas devem estar trancadas e fora de alcance.

  7. Relacionamento de confiança – O filho que teme contar a verdade esconde o que sente.

  8. Discernimento digital e emocional – Nem tudo é amor, e nem todo amigo virtual é confiável.

  9. Busque ajuda antes da crise – Psicoterapia não deve ser último recurso, mas prática preventiva.

  10. Reavalie os valores da casa – Pergunte-se o que está sendo ensinado em silêncio diariamente.

As orientações reforçam que a prevenção exige intenção e constância: “Prevenir não é adivinhar o que pode dar errado. É cuidar intencionalmente do que pode ser protegido”, concluiu o pastor Josué. “O que você pode mudar hoje para salvar o seu filho, a sua filha, amanhã? Pais, esse é o momento de despertar”.